Biografia - Rosalina Filomena da Cunha e Soares Rebelo |
Biografia de Rosalina Filomena da Cunha e Soares Rebelo (1908-2007), nome literário Filomena da Cunha para Dicionário no Feminino, (séculos XIX-XX) Vol II, Livros Horizonte, coordenação de António Ferreira de Sousa e outros….
Entre 1937 a 1938 fez o Curso de Guarda-livros e Contabilidade na London Chamber Commerce e de Fellow do Instituto of Book-keepers, de Londres. Nesse mesmo ano fundou e dirigiu o Instituto de Comércio e Taquigrafia em Margão. A partir de 1939, após a morte do pai e até ao casamento, tomou o seu lugar na gestão da sua firma J. J. da Cunha Nova Goa. Interessou-se por várias matérias, percorreu diferentes currículos, desde música, medicina e contabilidade, etc. Foi atenta à causa das feministas e foi interveniente nessas lutas, divulgando-as através dos seus escritos, teses, conferências e encontros. O livro apresenta-se dividido em três partes. Em primeiro lugar, figuram dez artigos sobre o movimento feminista. Seguem-se três ensaios, um sobre o sorriso, outro sobre a figura célebre do goês Abade de Faria e o último dedicado à «Índia e seus encantos» publicado em Portugal Feminino (Ano VI, de Maio de 1936) com três fotogravuras: cascata de Sud-sagor, Taj mahal e Mesquita. Este artigo foi posteriormente reproduzido na integra pelo semanário O Independente em 16.06.1936 acrescido de uma prévia introdução. A terceira parte do livro apresenta as «anotações suplementares», nas quais uma súmula sobre os jornais em que Filomena colaborou bem como sobre a revista Portugal Feminino, enquadra o contexto dos anos trinta que esta obra retrata com o subtítulo Filomena da Cunha e os órgãos de imprensa, seguido de Referências aos escritos de Filomena Cunha, onde o autor regista «palavras de apreço com que a sua colaboração foi saudada e registada ainda em artigos de fundo». O índice completa-se identificando as catorze ilustrações de flores campestres utilizadas na separação dos textos. A terminar surge a bibliografia do autor e as suas participações em congressos. Este livro é parte da história da juventude de Filomena da Cunha que reentrou na sua vida no dia do quinquagésimo sexto aniversário de casada como presente surpresa de seu marido e familiares. O seu trabalho de escrita preenche um dos vazios na história dos movimentos de mulheres em Portugal. A falta de circulação de notícias entre as ex-colónias portuguesas e a metrópole não permitia que o que se passava em Portugal chegasse a Goa, embora o mesmo não se passasse em relação ao resto do mundo. Filomena da Cunha traduzia nos seus artigos, com genial poder de síntese, preciosas informações sobre os movimentos feministas do seu tempo, que atestam dela uma criteriosa investigadora sobre as lutas e ganhos obtidos a favor da emancipação das mulheres. Na sua escrita enumera os nomes das mulheres protagonistas, o que de maior relevo acontecia na Europa, Turquia, Egipto, Rússia, China, Japão e sobretudo na Índia, onde, afirma «apesar da diferença de religião, costumes e castas, as mulheres indianas de todas as condições sociais deram o seu contingente à causa da emancipação da mãe-pátria. Durante o tempo em que durou a desobediência civil, o movimento feminista fez progressos maiores do que durante a última década» (in O Heraldo, p. 2 cols. 1/2 de 02.07.1931). Noutro artigo refere: «Mrs. Sarojini Naidu, a distinta poetisa e fluente oradora de fama mundial, quando há pouco presidiu á conferência anual da Associação Indiana das mulheres, reunida em Madrasta, falou assim: «cada uma de vós deve fazer um cauteloso exame de consciência e perguntar a si própria como é que eu contribui pela causa da mulher, pelo progresso da minha terra e pelo progresso do mundo» (in diário Jornal da Índia de 10.09.1934). Preocupa-se em tratar das mais variadas teses nos mais variados países, desde as questões politicas, «Na Inglaterra muitas senhoras como Lady Cynthia Mosley, […] foram eleitas deputadas ao Parlamento (ou, M.P.) e a Miss Margaret Bonfield é a primeira mulher no Governo Laborista a ocupar o árduo cargo do Ministério de Trabalho. Miss Susan Lawrence M.P., há pouco presidiu à Conferência Anual do Partido Laborista e é a primeira vez nos anais da história que uma mulher teve esta honra» (in O Heraldo p.1, cols. 3/4 de 01.11.1930), às económicas «Uma japonesa, Mme. Suzuki, que é uma das mais ricas mulheres do mundo, é banqueira e negociante de arroz». (in O Heraldo, p. 2 cols. 1/2 de 02.07.1931), passando pelas aviadoras: «Miss Amy Johnson […] efectou sozinha no seu aeroplano Moth Jason o voo entre o aeródromo de Croydon (Inglaterra e Sydney (Austrália.)», (in O Heraldo p.1, cols. 3/4 de 01.11.1930) às conquistas legais «Na China […] devido ao decreto do grande reformador dr. Sun-Yat-Sem, as mulheres chinesas têm direitos iguais aos dos homens», (in O Heraldo, p. 2 cols ½ de 02.07.1931). Regozijou-se com as reformas de costumes inferiorizantes para as mulheres: «Na Turquia Musfatá Kemal Pashá tem trabalhado bastante pela emancipação da mulher; aboliu o uso do véu e a poligamia; promulgou iguais direitos tanto ao homem como à mulher, in (opus cito, ibidem), «É espantoso o progresso feito pelas mulheres nos últimos anos, tanto no Ocidente como no Oriente. Temos na vizinha Índia muitas mulheres que há poucos anos viviam na reclusão de zenana e não saiam à rua sem se cobrirem dum burka (pano comprido) e sem se meterem cautelosamente numa carruagem fechada. Agora porém a teansfromação é completa. É certo que ainda existe uma insignificante percentagem de mulheres indianas, especialmente no norte, que não aboliram completamente até hoje o purdah.» (in diário Jornal da Índia de 10.09.1934). Em relação às mulheres portuguesas escreveu nesse mesmo jornal «Em Portugal também a mulher se tem despertado e vai fazendo progressos, mas o movimento feminista português não é conhecido pelo mundo fora porque a sua voz ainda não se fez ouvir em nenhuma reunião internacional. Sobre esta opinião escreve em nota de roda pé o marido e editor: A participação da médica (1900) e sufragista portuguesa Adelaide Cabete (1867/1935) nos Congressos Internacionais Femininos de Gand (1913), Roma (1923) e Lisboa (1924) era desconhecida da Autora então vivendo nas longínquas terras da India. (in Ao sopro das brisas fagueiras do Indico, p.25) Os seus relatos mostram como uma jovem portuguesa na Índia percepciona as outras mulheres suas contemporâneas que lutavam pela igualdade dos seus direitos, as vitórias que alcançavam incluindo as relativas aos vestuários, na partilha dos espaços públicos e privados. Filomena da Cunha empenhou-se sobretudo a assinalar exemplos positivos de empenho, coragem e de conquistas bem sucedidas na longa estrada percorrida pelas feministas em prol do bem-estar de todos. Os seus escritos relatam as lutas das mulheres nos países do Oriente e Médio Oriente e também em Inglaterra não só com intuito de serem divulgadas pelo seu interesse de actualidade, mas também porque as apoia tecendo apelos para que essas novidades revolucionárias a favor da condição feminina tenham eco nos corações dos seus leitores e leitoras e sobretudo encoraja as mulheres. No artigo Ecos dum Congresso Feminista descreve: «As vastas salas que, há poucos anos atrás, eram povoadas de sedutoras odaliscas, zelosamente guardadas, forma invadidas pelas suas modernas compatriotas, libertas dos jugos tradicionais, usufruindo direitos políticos em igualdade com o homem, e pelas representantes de mais de 30 nações […] A representante do Brasil, um dos países que como a Turquia, concedeu todos os direitos políticos à mulher, fez uma viagem aérea de 5 dias para assistir ao Congresso. Jamaica foi representada por uma delegada de raça negra que surpreendeu as congressistas pela sua invulgar inteligência. O Egipto mandou 15 delegadas, chefiadas por Mme. Houda Charoui, e a Índia foi representada por duas delegadas muçulmanas, Begum Hamid Ali e Begun Hussein. O Congresso foi presidido por Mrs. Ashby Corbett, de nacionalidade Inglesa.[…] Lady Astor da Inglaterra disse que embora em certos países o ambiente não seja dos melhores para o sexo feminino, não se deveria desanimar, porque serão tomadas medidas para se reconquistar os direitos perdidos» in O Independente, 23.07.1935. este artigo foi transcrito em Portugal Feminino, Lisboa Ano VI, n.º 69, pág.13 em Outubro de 1935 com uma fotogravura da autora sobre os dizeres: A nossa prezadíssima amiga e colaboradora Filomena Cunha, jovem e talentosa feminista, que no Jornal da Índia, tem publicado curiosos artigos em defesa da causa que a inclui entre as suas mais combativas paladinas. E assim seria daí a poucos meses a jovem Filomena Cunha teria de enfrentar pela escrita um combate pela sua causa, a luta pelos direitos das mulheres. Um leitor que se assumiu contrário à emancipação das mulheres e atacou-a directamente pelas suas ideias feministas. É através da sua resposta a esse artigo que se sabe como agiam então alguns delatores das causas feministas, embora muitos desses argumentos tenham perdurado muitas décadas depois disso, e também como a paladina feminista de Goa retorquiu ao seu opositor quando disse “as mulheres tornavam[-se] feministas quando não viam possibilidade de arranjar marido...” ao que Filomena respondeu: “Isto é positivamente deslocado. Mrs. E. Pankurst, a conhecida Sufragista inglesa de saudosa memória, era casada; ela e as suas duas filhas Cristabel e Sylvia foram chefes do Partido Sufragista Feminino. A Presidenta do 12º Congresso da Aliança Internacional para o Sufrágio Feminino foi Mrs. Ashby Corbett; e ela é casada. Me. Halide Edib, a mulher que tanto lutou pela independência da Turquia e pelas suas compatriotas é casada e tem filhos. Existem tantos outros exemplos que seria fastidioso enumerar.” A outro argumento do antifeminista: “se antigamente as leis restringiam a esfera de acção das mulheres, não era com o intento de as prejudicar, mas de defendê-las do poder absorvente do homem”, Filomena objectou: “Os trabalhos extenuantes e rudes como cavar debaixo do sol e da chuva, cultivar a terra, ser costureira trabalhando até altas horas da noite, ser engomadeira, trabalhar horas intermináveis nas fábricas com remuneração inferior à do homem, que executa iguais trabalhos, não lhes eram vedados, mas só os bem remunerados, esses sim, eram feitos para os homens. Significará isto defendê-la do poder absorvente do homem?” Cristina Henriques, escritora e poetisa que fez em Coimbra a apresentação do citado livro classificou-os como: «um pedaço mágico de prosa, pela doce alegria que empresta às palavras, pelo fundo sereno de uma alma plena de optimismo, pela sábia arquitectura da palavra e da frase» (Manto de mulher, revista Munda, Coimbra n.º 35, Maio de 1998, pp 69-78). Bib: Outros: Acácio Lopes Ribeiro, Filomena da Cunha, uma escritora feminista, in Região de Cister, Alcobaça, n.º 576, 02.09.2004 ; Lembrando a escritora Feminista in a Voz de Alcobaça, 321.12.2005. Domingos José Soares Rebelo - L’abbé de Faria trad. Em inglês do artigo de Filomena da Cunha (Mapuca-Lupa - Outubro/1935) in Goans - Abroad and in British Lands (A study) Alcobaça, Quénia, 1944; “Portugal Feminino” - Arauto do Feminismo Português nos Anos 30 do século XX in Região de Cister, Alcobaça, nº471, 2002); No 1º centenário de Nascimento da Feminista Dra. Elina Guimarães 1904/91, Alcobaça (Maio/2006) Escritores goeses em prol da Criança e da Mulher, séc. XIX/XX (apontamento histórico-literário). Página da Educação (A), (revista mensal), Porto - Ao sopro das brisas fagueiras do Indico (apreciação critica pela Redacção da revista) em Internet (http://www.apagina.pt/arquivo/artigo.asp?ID=312) e reedição do artigo de Filomena da Cunha: necessidade de Instrução Feminina in A Página, nº114 (Julho/2002). Um artigo de |